Imaginemos a reação geral diante de
quem teve a audácia de afirmar que a Terra era redonda. Tal afirmação
conflitava com o saber oficial da época, que imaginava ser a Terra “plana como
uma mesa” e, se conflitava, mais ainda, com o senso comum. Assim, em
determinado momento, dizer que a Terra era redonda não passava de “heresia”.
Depois, chegou a vez do “herege”, Galileu
Galilei, dizer que a Terra se movia, e,
por tamanha “heresia” afrontava os
doutores do sistema, e por isso, quase foi levado às chamas da fogueira,
escapando desse destino por renegar a sua afirmação. Nicolau Copérnico, por
desmentir a visão oficial sobre sistema planetário, visão essa apoiada em
Ptolomeu, afirmando que o sol era fixo e que a Terra girava em seu redor, não
sofreu as agruras da perseguição porque não tornou público, enquanto vivo, as
suas “heresias”. Charles Darwin, quando formulou, baseado em suas pesquisas, a
teoria da evolução natural da espécie que se chocava com as teorias
criacionista dos livros sagrados, aceitas pelos seus pares cientistas, foi
expulso da Academia de Ciências, da Inglaterra, e impiedosamente, execrado como
“herege”.
Por sua vez, Karl Marx e Friedrich
Engels, abalaram os alicerces do conhecimento oficial, quanto à abordagem do
desenvolvimento da sociedade humana, dissecando, com profundidade o capitalismo
e desfazendo enigmas, como era a questão do valor, tornaram-se aos olhos do
saber instituído, grandes hereges.
Tomando-se como objeto o estudo do
movimento socialista e desnudando seus desvios e seus incontáveis insucessos,
somos levados a praticar inúmeras “heresias”, que fazem tremer os beatos que
cultuam certos dogmas, como se verdade fossem. Para esses beatos, de boa fé,
deles dispostos ao sacrifício de suas próprias vidas ou ao enfrentamento altivo
diante das câmaras de tortura, há a tendência de se assustar diante de algumas
“heresias” do tipo: “nunca existiu o Estado Operário”; “A Revolução Russa
prestou-se, tão somente, a construir, por um alto custo social, o capitalismo
de Estado”.
Para a construção do capitalismo de
Estado, não faltaram expedientes como trabalho forçado, expropriações de
produtos agrícolas impondo a fome, fuzilamentos sumários, campos de
concentração, industrialização forçada, depredação do meio ambiente e outras
tantas barbaridades.
Por sua vez, é assustadora a
“heresia” em se afirmar que a Terceira Internacional Comunista, pretensa
alavanca da revolução mundial, transformou-se em uma multinacional do
anticomunismo, prestando-se à consolidação do capitalismo de Estado na URSS e,
para tanto, apunhalando pelas costas qualquer iniciativa insurrecional rumo ao
socialismo.
Para outros, pode soar como
“perigosa heresia” a afirmação de que Leon
Trótsky, renegou o primeiro Trótsky e participou ativamente da construção
de falsos conceitos do tipo: “Estado Operário Degenerado”, “Revolução Traída”,
“Revolução Desfigurada”, “Revolução Política Regeneradora” e tantos outros
equívocos de natureza idealista, isto é, de natureza anti-marxista.
Tudo leva a crer que os beatos de
hoje, de diversos credos, imaginaram que estariam ao lado daqueles que
afirmaram ser a terra redonda ou que a terra se movia, ou que o sol era fixo em
relação à terra, ou concordaria com a teoria da seleção natural da espécie da qual
nasceu o homem.
Duvidamos, porém, que certas
pessoas, devotas de certas crenças políticas despidas de sustentação,
disponham-se, facilmente, a discutir seus credos, sem preconceitos e sem se
horrorizar com afirmações que fogem dos manuais produzidos criminosamente pela malfadada
Academia de Ciências da URSS, com as suas diversas variáveis do tipo: maoísmo, kruchevismo,
fidelismo e, sobretudo, o trotskismo, essa “sagrada verdade” que pretende
desvendar os “mistérios” responsáveis pelas derrotas do movimento socialista.
Contudo, cremos valer a pena dar ouvidos às “heresias” e submeter a uma
apreciação crítica as “verdades” fraudulentamente sustentadas por esses muitos
credos.
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