Atribui-se
a Julio Cesar o fato de que ele, no comando de suas tropas, chegou à beira do rio
Rubicão e pôs-se em dúvida se deveria ou não, atravessá-lo para enfrentar as
tropas de Roma. Depois de alguns momentos de vacilação, Julio Cesar resolveu
proceder à travessia, pronunciando antes a célebre frase “Alea jacta est”, “a
sorte está lançada”, pois tinha em conta que tal decisão não podia ser
revogada. É justamente esse desafio que se coloca e se colocaram para uma
fração de intelectuais como Michael Löwy, Isaac Deutscher, Pierre Broué, Daniel
Bensaïd e uns poucos outros. Eles até chegam à beira do Rubicão, entretanto são
tomados de súbito medo em atravessá-lo, em romper particularmente com as
postulações trotskistas e assumir que foi no X Congresso do Partido Comunista
russo onde se deram as bases teóricas para que sobre elas fosse erigido o
stalinismo, a partir das resoluções tomadas naquele conclave, resoluções essas
patrocinada pelos grandes líderes da Revolução Russa, Leon Trotsky e Vladimir
Lênin.
Esses
intelectuais não têm ou não tiveram, a coragem de dizer que o rei está nú. Mas,
de onde vem tamanho medo de transpor o Rubicão? Esses senhores desfrutam de uma
legião de seguidores que, beatamente, seguem as equivocadas análises sobre a
Revolução Russa, seja ela a do stalinismo ortodoxo, seja ela respaldada na obra
de Leon Trotsky. Assim sendo, têm eles o medo de perder o status de
intelectuais festejados e até bem aceitos por algumas instituições burguesas como
são as academias, em regra geral.
Esse fato, essa covardia intelectual, política
e, as vezes, moral, redunda em severos prejuízos para a causa socialista, uma
vez que são eles, referências, acalentadas até por setores da esquerda que se
julgam mais avançados. É patente e lamentável o fato de, a rigor, inexistir
pessoas com cabedal intelectual, capazes de assumir a tarefa de colocar de lado
a abordagem que tem sido feita da Revolução Russa, tanto como já dissemos, pelo
stalinismo ortodoxo que se prende a louvações infundadas ou a versão idealista
do trotskismo que, se negou e se nega, a romper com as resoluções do X
Congresso do Partido Comunista russo.
É
claro que devemos render homenagens aos esforços feitos por intelectuais da
estirpe de Isaac Deutscher, em lançar luz sobre o episódio da Revolução Russa ,
mas não devemos deixar de entender os profundos limites de suas obras.
Primeiro, ele circula em torno de uma admiração profunda pela figura de Leon
Trotsky e isso o impede de enxergar o caráter idealista de suas análises e de
seus posicionamentos em relação ao processo dado na URSS. Deutscher não
enxergou que o segundo Trotsky renegou o primeiro Trotsky de antes de 1917.
Sentimos
também em Daniel Bensaïd a sua chegada as margens do Rubicão, ao ponto de lhe
molhar os pés, entretanto, faltou-lhe a clareza e a coragem de pronunciar a
velha frase atribuída a Julio Cesar: “a sorte está lançada”, e assim ter
promovido a travessia. Não
sabemos se por livre escolha, mas a verdade é que esses senhores preferiram
manter a condição de intelectuais festejados e manterem os dogmas do stalinismo-trotskismo,
e isso é muito penoso, desde que pagamos e continuamos a pagar um alto tributo
social como decorrência da acachapante vitória da contrarrevolução que teve o dom
de transformar gigantes em pigmeus.
*é presidente do Centro de
Atividades e Estudos Políticos- CAEP
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