Aos trotskistas
Antes de tudo, devemos dizer,
claramente, que nossas opiniões nada tem de pessoais. Reconhecemos como
abnegados e de boa fé, a imensa maioria dos militantes das múltiplas correntes
do trotskismo. Reconhecemos, também, como soldados da Terceira Internacional
Comunista, uma legião de bravos e devotados. Lembramos que o PCB tinha, em suas
fileiras, pessoas da estirpe moral e da têmpera de Carlos Marighella, Mário
Alves, Joaquim Ferreira, Davi Capistrano, Apolônio de Carvalho e alguns outros,
dispostos a servir, mesmo com o preço de suas vidas, aos ditames dos seus
credos.
Infelizmente, cada um dos agrupamentos
políticos de matriz stalinista, considerava-se “o partido da revolução” e,
portanto, “o povo eleito de Deus”. Isso levava a descambar para a lógica de que
tudo que se fizesse era em nome da “causa” e, assim, era legítimo. Dessa
maneira, a prática de falsificar a História, excluir e exterminar dissidentes,
promover a calúnia como instrumento de disputa, desqualificar os desafetos, eram
condutas naturais dentro dessa ótica.
O trotskismo, como produto
subjacente, da contrarrevolução vitoriosa, na medida em que não assumiu a
derrota e não rompeu com as resoluções políticas aprovadas no X Congresso do PC
russo, em 1921, particularmente com o monolitismo, o ultracentralismo
burocrático e o conceito de “partido da revolução”, consagrou-se como uma
indiscutível corrente stalinista, embora dissidente da Terceira Internacional.
Voltemo-nos a pensar. Como se
explicaria o múltiplo fracionamento dos trotskistas, não fosse o monolitismo
levado às últimas consequências? Como se explicaria a impossibilidade de
conviver, sob o mesmo teto, os diversos grupos que se assumem como trotskistas
e se ocupam em se acusar reciprocamente? Eis algumas perguntas que reclamam
respostas sensatas.
Por sua vez, torna-se necessário
lembrar que, um dos mais eficazes, pois bem fundamentado, crítico do modelo de
partido defendido por Lenine, em 1903, foi, justamente, Leon Trotsky, através
de sua genial obra “Nossa Tarefa Política”, publicado em 1904. Nessa obra,
Trotsky, depois de reverenciar Pavel Axerold, chamando-o de mestre, deu curso à
tese confirmada do substituísmo, que
consistia em prenunciar que o modelo leninista de partido levaria o partido a
substituir os trabalhadores, o Comitê Central substituir o partido e uma figura
canonizada substituir o Comitê Central. Não somente foi confirmada essa
profecia, como o substituísmo, na URSS, teve como partícipe, na sua construção,
o empenho talentoso de Leon Trotsky. Dessa forma, Trotsky, de 1917, renegou o
Trotsky profético, de 1904. Eis um fato irrefutável.
Não é à toa que os trotskistas se empenham
em esconder a sua obra “Nossa Tarefa Política” e, em seu lugar, divulgam outras,
calcadas nos conceitos equivocado de “revolução traída”, “revolução
desfigurada”, “revolução política regeneradora”, “Estado operário
burocratizado”, “momento termidoriano da Revolução Russa” e outros despropósitos
que só se prestaram e se prestam a aglutinar seguidores beatos e acríticos, que
em nada ou quase nada contribuem para a luta anticapitalista.
Falsificando a história, Trotsky,
expulso da URSS, passou o resto de sua vida empenhado em afirmar que havia sido
leninista desde sempre. Por sua vez, ele não teve a hombridade de se reportar à
“Oposição Operária”, liderada por Alexandra Kollontai, escondendo sua postura
de opressor e perseguidor dessa fração política.
Ao invés da fúria dos beatos, diante
dos questionamentos aos seus “santos” infalíveis, ao invés de se enredar nas
acusações pessoais, tentando a desqualificação, deveriam, os trotskistas, em
nome dos interesses da revolução, encarar esses questionamentos como de
natureza política, ou seja, despido de qualquer propósito menor. Essa posição é
a que devemos esperar daqueles que pretendem a discussão livre e democrática,
acima dos credos, pois, como já disseram, a dúvida é um dos pilares do saber e
a convicção é mais perniciosa do que a própria mentira.
Por fim, acrescentemos, para
avaliação, o seguinte fato: nos seus quase noventa anos de existência, o
trotskismo teve um papel residual em todos os processos revolucionários, quando
não completamente ausentes. Assinalemos alguns casos. A Revolução Chinesa não
teve a participação dessa corrente política. Na guerra civil da Espanha, os
trotskistas tiveram um papel danoso, quando investiram contra o POUM. Na França
da frente popular de Léon Blum, da mesma forma. E que dizer de sua ausência na revolução
cubana? Ou da revolução boliviana, de 1952? E do processo chileno? E quanto ao
“Maio” francês? Em todos os episódios históricos significativos, pós Revolução
Russa, o trotskismo teve participação próxima de zero e, em alguns casos, se
assemelhavam, pelo seu artificialismo, a algo parecido a uma verdadeira ficção
política.
Bem no estilo stalinista, o
trotskismo não se atém à História e, quando a faz, procura distorcê-la ou
tornar cada fato histórico, de relevância, em página virada. Eis o verdadeiro
caráter dessa corrente política, sempre predisposta ao gueto com seu sectarismo
insano.