segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Heresias




Heresias

            Imaginemos a reação geral diante de quem teve a audácia de afirmar que a Terra era redonda. Tal afirmação conflitava com o saber oficial da época, que imaginava ser a Terra “plana como uma mesa” e, se conflitava, mais ainda, com o senso comum. Assim, em determinado momento, dizer que a Terra era redonda não passava de “heresia”.
             Depois, chegou a vez do “herege”, Galileu Galilei, dizer que  a Terra se movia. Tamanha “heresia” afrontava os doutores e, por isso, quase foi levado à fogueira, escapando desse destino por renegar a sua afirmação. Nicolau Copérnico, por desmentir a visão oficial sobre sistema planetário, visão essa apoiada em Ptolomeu, afirmando que o sol era fixo e que a Terra girava em seu redor, não sofreu as agruras da perseguição porque não tornou público as suas “heresias”. Charles Darwin, quando formulou, baseado em pesquisas, a teoria da evolução natural da espécie que se chocava com as teorias criacionista dos livros sagrados, aceitas cientistas e então, foi expulso da Academia de Ciências, da Inglaterra, e execrado como “herege”.
            Por sua vez, Karl Marx e Friedrich Engels, abalaram os alicerces do conhecimento oficial, quanto às suas abordagens sobre a sociedade humana, dissecando, com profundidade o capitalismo e desfazendo enigmas. Por isso tornaram-se, aos olhos do saber oficial, grandes hereges.
            Tomando-se como objeto o estudo do movimento socialista e desnudando seus desvios e seus incontáveis insucessos, somos levados a praticar inúmeras “heresias”, que fazem tremer os beatos que cultuam certos dogmas, como se verdade fossem. Para esses beatos, de boa fé, deles dispostos ao sacrifício de suas próprias vidas ou ao enfrentamento altivo diante das câmaras de tortura, há a tendência de se assustar diante de algumas “heresias” do tipo: “nunca existiu o Estado Operário”; “A Revolução Russa prestou-se, tão somente, a construir, por um alto custo social, o capitalismo de Estado”.
           Para a construção do capitalismo de Estado, não faltaram expedientes como trabalho forçado, expropriações de produtos agrícolas impondo a fome, fuzilamentos sumários, campos de concentração, industrialização acelerada, depredação do meio ambiente e outras barbaridades.
            Por sua vez, é assustadora a “heresia” em se afirmar que a Terceira Internacional Comunista, pretensa alavanca da revolução mundial, transformou-se em uma multinacional do anticomunismo, prestando-se à consolidação do capitalismo de Estado na URSS e, para tanto, apunhalando pelas costas qualquer iniciativa insurrecional rumo ao socialismo.
            Para outros, pode soar como “heresia” a afirmação de que Leon Trótsky, renegou o primeiro Trótsky e participou ativamente da construção de falsos conceitos do tipo: “Estado Operário Degenerado”, “Revolução Traída”, “Revolução Desfigurada”, “Revolução Política Regeneradora” e outros equívocos de natureza idealista.
            Tudo leva a crer que os beatos de hoje, de diversos credos, imaginam que estariam ao lado daqueles que afirmaram ser a terra redonda ou que a terra se movia, ou que o sol era fixo em relação à terra, ou concordariam com a teoria da seleção natural da espécie, da qual nasceu o homem.
            Duvidamos, porém, que essas pessoas, devotas de certas crenças políticas, despidas de sustentação, disponham-se, facilmente, a discutir seus credos, sem preconceitos e sem se horrorizar com afirmações que fogem dos manuais criminosos da malfadada Academia de Ciências da URSS, com as suas diversas variáveis do tipo: maoísmo, kruchevismo, fidelismo e, sobretudo, o trotskismo. Verdades que pretendam explicar os motivos das sucessivas derrotas do movimento socialista precisam ser encaradas sem preconceitos. Contudo, cremos valer a pena dar ouvidos às “heresias” e submeter a uma apreciação crítica as “verdades” fraudulentamente sustentadas por esses muitos credos.

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