DIREITISMO,
DOENÇA SENIL DO COMUNISMO
“Esquerdismo doença
infantil do comunismo”, de Vladimir Lenine, tornou-se um clássico da literatura
socialista, leitura recomendada aos militantes que pretendam ter noção da tática
no encaminhar às propostas revolucionárias. O esquerdismo, segundo Lenine,
consiste em se fechar nos postulados ideológicos sem perceber a necessidade de
trabalhar as contradições do sistema, pois, servindo-se delas, é possível sermos
impelidos à conquista do socialismo.
É básico levar em conta
a realidade e saber trabalhar dentro dos seus parâmetros, buscando ultrapassar
os limites. Devemos, portanto, estar presente onde está o povo e, convivendo
com o atraso popular, procurar demover as massas de suas superstições, crendices
e preconceitos. O principismo, o sectarismo, a intolerância são traços do
esquerdismo, tido por Lenine como “doença infantil” que provoca prejuízos na
consecução de uma política revolucionária. Ele via no esquerdismo uma doença
sanável, e isso é diferente do direitismo que se fez e se faz presente no “movimento
socialista”, descaracterizando-o de maneira a servir aos interesses do
capitalismo.
Nos primórdios do
movimento socialista, quase não esteve presente o direitismo. Vejamos o caso da
Associação Internacional dos Trabalhadores – AIT. Nessa associação, de grandes
venturas, existiam duas destacadas correntes: os anarquistas e os marxistas.
Havia entre essas duas correntes muitas convergências, sobretudo quanto ao seu caráter
anticapitalista. Foi a Primeira Internacional que participou da primeira
insurreição proletária vitoriosa, a Comuna de Paris, em 1871, mesmo que essa
vitória tenha sido efêmera, pois o poder dos comunards durou apenas 72 dias.
Em 1886, foi organizada
a Segunda Internacional, e aí, não estavam mais os anarquistas; a hegemonia
dessa nova associação era dos marxistas. Quando nos fins do século XIX, o
capitalismo atingiu sua fase imperialista, a realidade econômica, política e
social, sofreu mudanças e, mesmo que elas não tenham sido de qualidade,
embaralharam a cabeça de alguns intelectuais socialistas, dentre esses
destacava-se Eduardo Bernstein, o mais ilustre dos dirigentes da Segunda
Internacional, uma vez que Engels já havia falecido. Diante de mudanças
econômicas, como a criação das sociedades de economia aberta, Eduardo Bernstein
atribuiu que a crescente concentração de capital passava a dar lugar à sua democratização
através de vendas maciças de ações que permitiam a alguns operários, comprá-las
e se tornarem sócios anônimos dos empreendimentos capitalistas, no entender
desse erudito senhor.
Do ponto de vista
político, os partidos operários viram crescer suas bancadas nos Parlamentos e
esse fato levava a que alguns proclamassem o fim da via insurreicional
defendida pelo marxismo. Outro fato que abalou alguns pensadores socialistas
foi que o nível de miséria na Europa Ocidental tinha diminuído. Esse fato poria
por terra a tese da miséria crescente e, na medida em que não se percebia que o
imperialismo havia deslocado a miséria para a Ásia, a África, a América Latina,
preferia-se o curto caminho da proclamação da necessidade em se fazer uma
revisão do marxismo pela direita, propondo o caminho gradualista para o
socialismo.
Nesse momento histórico existiam quadros socialistas
devidamente qualificados para se opor, de forma veemente, ao desvio direitista do socialismo. Na galeria
dos defensores do marxismo, podemos nominar Plekhànov, Kautsky, Franz Mehring,
Lênin, Trotsky e, sobretudo, a brilhante Rosa Luxemburgo que soube dizer: “alto
lá, senhor, seu arrazoado direitista funda-se no equívoco. As sociedades
abertas são uma fraude, o caminho parlamentar é uma meia verdade que passa por
cima do conceito real de poder. E quanto à miséria, ela campeia no mundo
capitalista que vai muito além do seu umbigo germânico”.
O direitismo manifestado na Segunda Internacional foi
rechaçado e isso se deu no começo do século XX, em plena emergência do
imperialismo. Entretanto, nos anos de 1912/13, quando o imperialismo
preparava-se para o confronto bélico e necessitava quebrar a espinha dorsal do
movimento socialista, o embate favoreceu ao imperialismo que conseguiu
converter os partidos socialistas em agremiações social-patriotas a reboque dos
interesses das suas respectivas burguesias, apesar dos esforços desesperados de
uma minoria que reagia a essa capitulação.
Por ocasião da Primeira Guerra, deu-se a Revolução
Russa e, com ela, acenderam-se as esperanças de que a propositura
revolucionária triunfaria no mundo e ressuscitaria a revolução mundial derrotada
com o inestimável apoio do direitismo enfronhado nas hostes socialistas.
As esperanças, entretanto, terminaram em tragédia. A Terceira
Internacional, criada em 1919, com o objetivo de reanimar o movimento
revolucionário, com a vitória da contrarrevolução em escala mundial, terminou
por se tornar a maior multinacional do
direitismo, sob o carimbo do “marxismo-leninismo”. Hoje, o direitismo
travestido de esquerda é a regra geral. Aqui e alhures. Mesmo aqueles que se
propunham a ser bolsões de resistência, como os trotskistas, não cumpriram nem
cumprem esse papel. Reproduzem todos os vícios stalinistas, que vão do
criminoso monolitismo a praticas sectárias, às vezes confundidos como radicais
quando não passam de raivosos e intolerantes e essa postura os isola. Alguns
deles, sob o carimbo do “marxismo-leninismo-trotskismo”, assumem,
despudoradamente, uma postura direitista, prestando-se à condição de ofice boys
ou ofice girls da burguesia, seja enquanto executivos do Estado burguês em seus
diversos níveis.
A humanidade carece de uma esquerda revolucionária nos
moldes da Primeira Internacional, parte da Segunda e primórdios da Terceira.
Mas para termos essa esquerda revolucionária, teremos que promover um profundo
trabalho de depuração que determine criar um movimento realmente
anticapitalista e esse movimento só poderá existir com a ruptura total com a
senil doença do comunismo: o direitismo.