quarta-feira, 20 de março de 2013

“ATRAVESSAR O RUBICÃO”



            Atribui-se a Julio Cesar o fato de que ele, no comando de suas tropas, chegou à beira do rio Rubicão e pôs-se em dúvida se deveria ou não, atravessá-lo para enfrentar as tropas de Roma. Depois de alguns momentos de vacilação, Julio Cesar resolveu proceder à travessia, pronunciando antes a célebre frase “Alea jacta est”, “a sorte está lançada”, pois tinha em conta que tal decisão não podia ser revogada. É justamente esse desafio que se coloca e se colocaram para uma fração de intelectuais como Michael Löwy, Isaac Deutscher, Pierre Broué, Daniel Bensaïd e uns poucos outros. Eles até chegam à beira do Rubicão, entretanto são tomados de súbito medo em atravessá-lo, em romper particularmente com as postulações trotskistas e assumir que foi no X Congresso do Partido Comunista russo onde se deram as bases teóricas para que sobre elas fosse erigido o stalinismo, a partir das resoluções tomadas naquele conclave, resoluções essas patrocinada pelos grandes líderes da Revolução Russa, Leon Trotsky e Vladimir Lênin.
            Esses intelectuais não têm ou não tiveram, a coragem de dizer que o rei está nú. Mas, de onde vem tamanho medo de transpor o Rubicão? Esses senhores desfrutam de uma legião de seguidores que, beatamente, seguem as equivocadas análises sobre a Revolução Russa, seja ela a do stalinismo ortodoxo, seja ela respaldada na obra de Leon Trotsky. Assim sendo, têm eles o medo de perder o status de intelectuais festejados e até bem aceitos por algumas instituições burguesas como são as academias, em regra geral.
             Esse fato, essa covardia intelectual, política e, as vezes, moral, redunda em severos prejuízos para a causa socialista, uma vez que são eles, referências, acalentadas até por setores da esquerda que se julgam mais avançados. É patente e lamentável o fato de, a rigor, inexistir pessoas com cabedal intelectual, capazes de assumir a tarefa de colocar de lado a abordagem que tem sido feita da Revolução Russa, tanto como já dissemos, pelo stalinismo ortodoxo que se prende a louvações infundadas ou a versão idealista do trotskismo que, se negou e se nega, a romper com as resoluções do X Congresso do Partido Comunista russo.
            É claro que devemos render homenagens aos esforços feitos por intelectuais da estirpe de Isaac Deutscher, em lançar luz sobre o episódio da Revolução Russa , mas não devemos deixar de entender os profundos limites de suas obras. Primeiro, ele circula em torno de uma admiração profunda pela figura de Leon Trotsky e isso o impede de enxergar o caráter idealista de suas análises e de seus posicionamentos em relação ao processo dado na URSS. Deutscher não enxergou que o segundo Trotsky renegou o primeiro Trotsky de antes de 1917.
            Sentimos também em Daniel Bensaïd a sua chegada as margens do Rubicão, ao ponto de lhe molhar os pés, entretanto, faltou-lhe a clareza e a coragem de pronunciar a velha frase atribuída a Julio Cesar: “a sorte está lançada”, e assim ter promovido a travessia.          Não sabemos se por livre escolha, mas a verdade é que esses senhores preferiram manter a condição de intelectuais festejados e manterem os dogmas do stalinismo-trotskismo, e isso é muito penoso, desde que pagamos e continuamos a pagar um alto tributo social como decorrência da acachapante vitória da contrarrevolução que teve o dom de transformar gigantes em pigmeus.

                                                                                 
*é presidente do Centro de Atividades e Estudos Políticos- CAEP

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