O grande desafio
O maior desafio que têm os “marxistas-leninistas”
e os “marxistas-leninistas-trotskistas”, de boa fé, ou seja, a força política
que se autoproclama de esquerda, como temos dito reiteradamente, é de responder,
com clareza, ao seguinte questionamento: Como se explica o fato de o
capitalismo, vivendo sucessivas crises econômicas e financeiras, conseguir ter
a hegemonia política?
Formulemos melhor. O capitalismo
quando rompe com o feudalismo, através de suas sucessivas revoluções vitoriosas,
traz consigo um projeto indiscutivelmente revolucionário. Nos legou a
democracia política, com o voto universal e secreto; o direito de ir e vir;
liberdade de opinião e organização, e outros ganhos. Progressista em seu
desabrochar, com o passar dos tempos, quando avançou de sua fase liberal para a
fase monopolista e, por fim, para a sua fase imperialista, tornou-se anacrônico.
Por outro lado, em sua última fase, ele cria todas as condições objetivas para
o advento de uma nova ordem econômica e social, o socialismo.
O capitalismo imperialista passou a permitir
situações dramáticas, contrárias aos interesses da humanidade. Na lista quase
infinda de seus absurdos podemos recorrer à crueldade da Primeira Grande Guerra
interimperialista que devastou a Europa. Em seguida, veio a chamada Segunda
Grande Guerra, com todo o seu rosário de desatinos. É também produto desse
sistema exaurido o nazifascismo e o holocausto. Não podemos deixar de incluir o
bombardeio de Hiroxima e Nagasaki, que massacrou muitas vidas. Não bastassem
tantos crimes, esse sistema mantém uma cifra próxima a 2 bilhões de seres
humanos vivendo abaixo da linha de pobreza.
Face a esses fatos, retornemos ao nosso
questionamento: Como um sistema claramente esgotado, vivendo na UTI da
história, sem poder oferecer soluções para as inúmeras mazelas sociais, sem
poder oferecer qualquer perspectiva de felicidade, se mantém de pé? Eis o
questionamento básico para todos os que repudiam essa realidade e almejam um
outro tipo de sociedade, baseado na convivência harmoniosa e fraterna entre
todos.
Das academias ouvimos um discurso equivocado
quando afirmam que a sobrevivência do capitalismo deve-se à sua capacidade de
reinventar. Essa afirmação comete dois graves pecados. O primeiro deles é não
considerar que uma presumida capacidade de se reinventar não é infinda e,
assim, esgotado esse meio, haveremos de ser arrastados para a tragédia total,
caso o socialismo não tenha força para se impôr como alternativa. O segundo
grave erro, ou melhor, a esperteza de alguns, consiste em imputar a competência
do inimigo em se manter e, dessa forma, fugir da tarefa que devia ter o
movimento socialista em considerar suas responsabilidades, atentando para o
fato de que, enquanto a burguesia cumpriu e cumpre o seu papel histórico, o
mesmo não aconteceu e não acontece com os seus opositores. Muito pelo
contrário.
O stalinismo construiu uma cultura em que um
dos pilares é a sua “infalibilidade”. Tornou-se um refrão a afirmação do tipo:
“O Partido nunca erra”. Fiel a essa deslavada mentira é que toda análise de uma
esquerda de matriz stalinista segue o caminho esdrúxulo de culpar o inimigo
pelos nossos insucessos, como se não fosse o papel do inimigo buscar a derrota
do socialismo.
Em se tratando do Brasil, por exemplo, diante
do Golpe de 1964, eles afirmam: “O Golpe nasceu em Washington”, como se não
fosse esse o papel deles. Diante do golpe, que depôs o governo de Salvador
Allende, no Chile, em 1973, eles proclamam que foi a CIA quem articulou a queda
do governo chileno. Quanto ao massacre havido na Indonésia, em 1965, por
ocasião de um golpe de Estado, eles, da esquerda stalinista, se empenham em
esconder o episódio e não assumem que aquele massacre decorreu da política
moscovita em propor um caminho pacífico para o socialismo.
A infeliz verdade é que todos os princípios
do socialismo revolucionário foram revogados pela contrarrevolução que se
instalou na URSS, na década de vinte do século passado. Em lugar do princípio
da luta de classes, em lugar do princípio classe opressora versus classe
oprimida, impôs-se o “princípio” nação opressora versus nação oprimida.
Seguiu-se a esse estupro político e ideológico a construção de toda uma cultura
falando em nome do socialismo e do comunismo e nos levando a um empobrecimento
político sem precedentes.
Decorre desses fatos que, a presumida esquerda
ficou reduzida a um mero antiamericanismo, atropelando o conceito de
imperialismo e passando ao largo do fato de que ser antiamericano não implica
em ser anticapitalista, em ser socialista. Porém, ser socialista, vai muito
além do antiamericanismo, colocando-se como oposição global ao sistema vigente.
Prova de que o antiamericanismo não é socialista está no fundamentalismo
fascista islâmico, representado pelo Irã, Síria, Talibã e outras forças, cujo
móvel político é sua posição anti-ianque, e isso desperta simpatias da esquerda
convencional, quando o correto seria compreender que pretendemos derrotar o
imperialismo, porém, superando-o através do socialismo, e não derrotá-lo por
via do fascismo, do ultradireitismo.
Parece-nos evidente que os sucessivos erros e
a “infalibilidade” da esquerda stalinista é onde se encontra a resposta para a
descabida sobrevivência da ordem econômica e social vigente.
Na história, cabe às partes, cumprir os seus
papéis. A burguesia, como já dissemos, cumpriu e cumpre os seus. Resta, aos
socialistas revolucionários, buscar desempenhar a sua tarefa no sentido de
conquistar a transformação social. Nisso reside o cerne de nosso desafio, até
porque, se eles estão em crise, a crise do movimento socialista se apresenta
como muito mais profunda, muito mais aguda.
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