Sacripantas
Eis um adjetivo nada comum.
Ele qualifica pessoas com imperdoáveis defeitos de conduta. Um desses defeitos
diz respeito à prática da simulação e do charlatanismo, muitas vezes amparados
nas titularidades que são concedidas pelo sistema socioeconômico vigente, para
fraudar a verdade e proteger a mentira. São artesãos que se empregam na
construção e manutenção de uma cultura que se prende a formular falsos
conceitos e “eternas” inverdades.
É por essa razão que
costumamos designar de sacripantas os milhares ou mesmo centenas de senhores
titulados como cientistas políticos ou insuspeitos comentaristas dos fatos
relacionados às disputas em torno do poder.
Na sua maior parte,
resguardada uma ínfima minoria, os referidos senhores não têm o menor pejo em
designar o golpe de Estado de 1964 como o golpe
militar. A maioria deles, sabemos, procede assim por simples ignorância,
mas os sacripantas, os charlatães, o fazem por conveniência, por meio de vida, embora
não possamos deixar de reconhecer que uma parcela maior de pessoas desconhece
os fatos e os seus efeitos.
Com insistência, temos
lembrado que os militares compõem uma
corporação, subalterna, a serviço da “ordem constituída”. Isto quer dizer: Os
militares não formam uma classe social.
Nas sociedades divididas em
classes e camadas sociais, o poder, o Estado, é de classe. No capitalismo, o
Estado é da classe burguesa que exerce o seu domínio sobre o conjunto da
sociedade através de suas instituições, sejam elas de natureza pacífica, como é
o caso das escolas, ou de natureza armada, como são as forças da repressão.
Quando a democracia burguesa
mostra-se inapta a resistir aos perigos das mobilizações populares, como
ocorreu no período anterior a abril de 1964, a burguesia recorre ao seu braço
armado e institui o Estado de exceção, comumente chamado de ditadura, como
medida emergencial e transitória.
No Nordeste do Brasil é
comum um homem rico contratar um pistoleiro profissional para matar um
desafeto. Aos olhos da “justiça” e da sociedade, o bandido é aquele que foi
contratado. Esse mesmo raciocínio é aplicado pelos sacripantas às Forças Armadas.
Ora, elas são treinadas para
intervir sempre que a ordem capitalista tiver em perigo. A eles é dado cumprir
as tarefas sujas de perseguir, prender, torturar e matar, enquanto a burguesia
conserva as suas mãos “limpas”.
Depois que as Forças Armadas
e policiais cumprem o seu papel sujo e a ordem burguesa encontra-se em
segurança, os profissionais da truculência e dos serviços sujos são mandados de
volta aos quartéis e a burguesia retoma sua função de exercer diretamente o
Governo.
Chamar o período em que os
militares, como operadores prepostos da burguesia no Governo, de ditatura
militar, é uma impropriedade e ela é difundida, maciçamente, promovendo a
desinformação e a má informação sob o patrocínio dos já referidos charlatães.
O golpe de 1964 foi
operacionalizado pelos militares. Os governos exercidos pelos generais estavam
lá, para servir ao capitalismo, basta se observar quantos grupos econômicos
potencializaram suas fortunas nesse período, basta que se investigue quantos
militares fizeram fortunas e vão descobrir, facilmente, que todos eles se
mantiveram nos padrões do funcionalismo público.
Depois de cinquenta anos,
eis que alguns “gênios” da Academia vêm carimbando o golpe de 1964 como “civil-militar”
e isso não passa de uma reles piada, pois o golpe foi unicamente de caráter
burguês, que se propôs à tarefa “constitucional” de resguardar a propriedade
privada, resguardar o capitalismo. Cumprida sua missão, com as mãos sujas de
sangue, eles voltaram aos quartéis, onde continuam sendo alimentados e
adestrados para cumprir novas missões que lhes forem determinadas pelo sistema
do qual são subalternos.
Definir com justeza o golpe
de 1964 é dizê-lo um golpe contrarrevolucionário, de natureza preventiva,
diante da escalada das mobilizações de massa, que levava a uma situação pré-revolucionária
e a burguesia tinha, bem viva, a lembrança do que ocorrera em 1959, em Cuba. Isto,
sim, é a verdadeira história e, sobre ela, temos, isoladamente, repetido, há 40
anos, porém, como se sabe, a mentira do Cardeal
vale mais do que milhões de verdades
ditas por um simples sacristão.
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